Barnabé E Os Novos Ministros Da Casa Do Tesouro
Introdução
No Antigo Testamento, o dízimo e algumas ofertas especiais eram destinadas, respectivamente, aos levitas e aos sacerdotes da família de Arão. Essas ofertas também eram chamadas de "santas" ou kodesh (Nm 18).
Além das ofertas voluntárias, também podiam ser consagrados animais, casas e campos (Lv 27:1-28). Essas coisas se tornavam santas e, no tempo certo, deveriam ser levadas à casa do Tesouro (Ml 3:8-10). Uma vez prometidas, não podiam mais ser usadas pelo proprietário segundo seu critério, pois agora eram coisas sagradas e pertenciam ao Senhor.
Portanto, as coisas consagradas eram tão santas (kodesh) quanto o dízimo. No entanto, havia uma diferença importante: para ser santo (kodesh), o dízimo não dependia do desejo ou da promessa do adorador. Assim como o sábado (Êx 20:8-11), o dízimo já era sagrado por nomeação divina (Lv 27:30, 32).
Neste artigo, abordaremos o sistema da casa do Tesouro como o centro receptor das coisas santas, tendo os levitas e os sacerdotes como administradores. Também enfatizaremos a transição para o novo ministério e a nova casa do Tesouro mencionada particularmente em Atos 4:34-37, no caso de Barnabé, um levita convertido à fé no Senhor Jesus.
A casa do Tesouro no Antigo Testamento
Na Bíblia, as coisas santas, seus guardiões e a casa do Tesouro estão integrados em um sistema administrativo designado por Deus (Lv 27:8-33; Nm 18; Ml 3:8-10). Nesse contexto, era direito do levita e do sacerdote (kohen, levita da família de Arão) serem sustentados pelas coisas santas – uma indicação da legitimidade de seu ministério e missão como guardiães da casa do Tesouro.
Um levita tinha direito a uma porção maior do dízimo (Nm 18:21-24), e os sacerdotes, a uma parte do dízimo e de certas ofertas consagradas (Nm 18:7-20; 26-28). Entre as coisas santas, já mencionadas anteriormente, estavam campos e casas (Lv 27:14-23).
É importante lembrar que o dízimo trazido seria (2Cr 31:6) sobre as coisas consagradas (kodesh) e seus rendimentos. O mesmo ocorria com a propriedade não consagrada (Lv 27:30-33). Além disso, ao ser vendida, o valor total da propriedade consagrada deveria ser entregue ao tesouro. Mas se o proprietário que a consagrou quisesse a propriedade de volta, deveria pagar o valor da propriedade estipulado na avaliação do sacerdote e acrescentar 20% ao valor estipulado pelo kohen (Lv 27:19), assim como com o dízimo (v. 31).
Nesse sentido, as coisas consagradas eram tratadas de maneira semelhante ao dízimo, ou seja, o proprietário não poderia retê-las total ou parcialmente, o que nos lembra o pecado de Ananias e Safira (At 5:1-4), que retiveram uma parte do que fora prometido.
O fato de os levitas e sacerdotes terem sido escolhidos como depositários dos dízimos, bem como das ofertas e das coisas consagradas que eram dadas a Deus, os tornava guardiões do sistema estabelecido por Deus e, portanto, deveriam ser considerados como Seus representantes. Trazer essas coisas para o sacerdote era o mesmo que trazê-las para Deus, algo que está muito claro na Bíblia (veja Lv 2:1, 2, 8; 5:7, 8; 7:35; 23:10, 11; Nm 18:28). Assim, não trazer os dízimos e ofertas à casa do Tesouro, que era administrado pelos representantes de Deus, era equiparado a roubar a Deus (Ml 3:8-10).
Por outro lado, a doação fiel de dízimos, ofertas e coisas consagradas à casa do Tesouro está relacionada à ideia de reavivamento espiritual em vários exemplos bíblicos (1Cr 29:1-20; 2Cr 31:1-21; Nm 10:32-39; 13:9-13; Ml 3:7-10).
Coisas santas e Pentecostes
No reavivamento experimentado durante o Pentecostes (At 2:1-4; ver também os capítulos 4 e 5), a fidelidade e generosidade foram partes integrantes da oferta de coisas consagradas. O exemplo negativo de Ananias e Safira, que não cumpriram sua promessa e tentaram encobrir seu pecado com uma mentira, é claramente uma repreensão divina à ganância.
Nessa passagem de Atos, também há um novo aspecto relacionado ao destino das coisas consagradas ao Senhor. Enquanto no Antigo Testamento a propriedade consagrada era levada aos levitas (ver Lv 27:14-23), neste relato do livro de Atos, os convertidos venderam suas propriedades e colocaram todo o valor da venda aos pés dos apóstolos (At 2:44-45).
Depois de serem dedicados a Deus, esses recursos eram considerados santos. No entanto, em vez de serem levados ao Templo, aos levitas e aos sacerdotes, eram colocados "aos pés", ou seja, sob a coordenação dos apóstolos, para atender às necessidades dos crentes (e obviamente dos ministros) durante a crise enfrentada pela comunidade.
O episódio de Ananias e Safira sugere que essa dádiva era mais do que uma simples oferta ocasional ou uma contribuição comum e espontânea para a caridade. A narrativa faz mais sentido no contexto bíblico da rotina diária do Templo Judaico, no qual o conceito de coisa santa estava muito presente, conforme relatado em Levítico 27. O casal de Atos 5 havia prometido fazer sua doação na íntegra, convertendo, assim, aquele campo em um kodesh – santo para o Senhor. Mas no momento de entregar sua doação, eles apenas fingiram estar doando tudo, embora estivessem, em realidade, retendo uma parte. Então, o Espírito revelou ao apóstolo que o kodesh estava sendo violado, pois estavam mentindo com a intenção de não dar tudo. Como bem observa Ellen G. White:
“Ananias e Safira haviam feito o voto de dar ao Senhor o produto da venda de certa propriedade” (Ellen G. White, Atos dos Apóstolos, p. 40). “Quando o coração é tocado pela influência do Espírito Santo, e é feito um voto de dar certa importância, aquele que fez o voto não tem mais nenhum direito sobre a porção consagrada” (Ellen G. White, Atos dos Apóstolos, p. 42). Mas Ananias e Safira “Falaram entre si sobre o caso e resolveram não cumprir a promessa” (Ellen G. White, Atos dos Apóstolos, p. 41).
Embora o valor da venda ainda não estivesse definido, a quantia total que seria obtida pela venda do campo deveria ser dada para a igreja, pois a propriedade agora era uma coisa santa (kodesh).
O relato não registra Ananias afirmando que a oferta correspondia ao valor total da propriedade. Portanto, a condenação pelo apóstolo decorreu de uma revelação do Espírito, que exigia que a declaração de Ananias fosse compatível ao que fora prometido no voto do casal, o que converteria em kodesh a propriedade. Caso tivessem prometido apenas uma parte do campo, eles teriam evitado o pecado (Lv 27:16).
De acordo com a lei, conforme mencionado anteriormente, as coisas sagradas também deveriam ser dizimadas (2Cr 31:6). Assim, quando as propriedades eram vendidas, o valor total era levado aos apóstolos, o que indica que, naquele tempo, o dízimo também era manuseado.
Além disso, como a Bíblia indica, o dízimo era destinado para o sustento dos levitas e dos kohen (que recebiam o dízimo do dízimo), mas eles não eram os donos dos dízimos. Séculos antes da existência dos levitas, o dízimo já havia sido dado para apoiar a ordem de Melquisedeque (Gn 14:18-20), o mesmo Melquisedeque que, mais tarde, representaria Jesus, o Sacerdote Eterno vivo, em Seu ministério não levítico (Hb 7:1-10). Jesus é o verdadeiro proprietário dos dízimos e ofertas, e em diferentes momentos Ele os disponibiliza a quem Ele deseja para o sustento de Seus ministros e para o trabalho de pregar o evangelho a todas as nações (Mt 28:19).
O testemunho de Barnabé
Tendo compreendido isso, ainda no contexto dos efeitos da obra do Espírito Santo em Atos 2, Lucas fez questão de mencionar outra doação, identificando um doador emblemático – Barnabé. Por que teria Lucas mencionado Barnabé entre tantos outros que já haviam vendido suas terras e casas e as consagrado ao Senhor (ver At 4:34-37)?
Barnabé, um levita familiarizado com a lei, tinha o dever de conduzir as pessoas à verdade (Ml 2:4-7). Portanto, ele deixou de lado a moribunda tradição levítica – que já havia cumprido seu papel – e, guiado pelo poder do Espírito Santo, aceitou o chamado para um novo ministério (At 13:2-3).
Barnabé compreendeu que a missão divina original que Israel havia negligenciado era levar a bênção de Abraão não apenas aos judeus, mas a todo o mundo (At 13:46-47). Assim, ao Lucas relatar a oferta emblemática do levita Barnabé, ele reforça a nova orientação dada pelo Espírito Santo e praticada por judeus e gentios convertidos ao judaísmo. Agora eles “traziam os valores correspondentes e os depositavam aos pés dos apóstolos” (At 4:34, 35). Pelo Espírito, os apóstolos passaram a ser reconhecidos como os novos depositários das ofertas sagradas (kodesh) devidas ao Senhor (o que incluía dízimos e ofertas), e não mais os levitas.
Um novo ministério havia surgido. O primeiro foi a ordem de Melquisedeque, séculos antes dos levitas. O segundo, o ministério dos levitas e do kohen na nação israelita, enquanto o Templo funcionava. O terceiro, como vimos na sucessão histórica bíblica, é o ministério dos apóstolos, e o último, o mais sublime dos ministérios, é o do próprio Jesus, o Verbo, o Sumo Sacerdote, o verdadeiro Kohen (Hb 8:1-2).
Pelo seu exemplo, o levita Barnabé reconhece que os apóstolos são os novos ministros de Deus. Eles O representam e também a igreja – o Seu corpo. Movido pelo Espírito Santo, Barnabé reconhece que seu direito ministerial passou para outras mãos.
Em vez de solicitar ao sistema levítico os lucros da venda de terras e casas, ou seja, as coisas consagradas (Lv 27:14-23), e do dízimo (Lv 27:30-33; Mt 23:23), Barnabé reconhece que o direito às coisas sagradas agora pertence à igreja e à sua liderança, nomeada pelo Espírito. Assim, o levita entregou o valor total da venda do campo que ele tinha consagrado ao Senhor aos pés dos apóstolos, que não eram levitas nem tinham a função legal de kohen.
Em vez de conduzir todos em direção ao templo, que anteriormente era o receptor das dádivas consagradas, Barnabé se curva e reconhece nos apóstolos o novo e legítimo ministério da casa do Tesouro, o qual sucede aos levitas, assim como eles sucederam à ordem sacerdotal física de Melquisedeque.
O Templo cessa, mas o Evangelho continua
Dessa forma, conforme indicado pelo Espírito Santo, o Senhor transferiu para a igreja (representada por seus líderes) não apenas o direito de receber as dádivas (agora conferido à nova casa do Tesouro), mas também o dever de pregar o Evangelho a todo o mundo, dever esse que havia sido negligenciado pela nação israelita.
E como sinal concreto de que o ministério levítico havia terminado, o Senhor tirou deles, de maneira definitiva, o templo e dispersou a linhagem levítica e sacerdotal. O véu rasgado do santuário (Mt 27:51) também era uma indicação de que o ministério levítico havia chegado ao fim, o que foi posteriormente ratificado pela destruição do templo. Como povo, os israelitas rejeitaram o Senhor, o verdadeiro Sacerdote, e assim o ministério passou para outras mãos. Como exemplos dessa mudança, a Bíblia diz que o povo de Deus é a igreja construída por Jesus (Mt 16:18); que a salvação (a bênção de Abraão) para todas as nações é pregada pela igreja (Mt 28:19-20); e que, segundo o Espírito, foram dados à Igreja poder e coisas santas (At 2, 4:34-37). Foi o Espírito que inspirou a muitos que possuíam terras ou casas a vendê-las e “[trazer] os valores correspondentes” (At 4:34).
Por que teria o autor de Atos identificado Barnabé, apontando o fato de que, mesmo sendo um levita, ele também vendeu um campo e “trouxe o dinheiro e o colocou aos pés dos apóstolos” (At 4:37)? Essa menção não pode ser acidental. Um novo ministério havia sido inaugurado, não mais baseado na linhagem levítica e no sacerdócio aarônico, mas nos apóstolos, os ministros da igreja de Jesus, aos pés de Quem, doravante, os dons e as coisas santas deveriam ser colocados, tanto por judeus quanto por gentios.
Como Barnabé era um levita, seu exemplo é um endosso do direito da igreja de receber, no lugar dos sacerdotes, os dízimos e as ofertas do antigo sistema levítico usados para o apoio do ministério e a pregação do evangelho.
Conclusão
O sistema dos levitas cessou; o templo não existe mais. Deus distribui o dízimo e as ofertas sagradas – kodesh – com quem Ele deseja, como a Bíblia indica.
Jesus, nosso sacerdote, está vivo e tem direito aos dízimos e ofertas (Hb 7:1-8). Por algum tempo, Ele deu o dízimo à ordem de Melquisedeque. Mais tarde, Ele o deu, juntamente com as ofertas, ao sistema levítico, cujo templo era apenas uma cópia do modelo (Êx 25:9, 40; 26:30) e uma sombra do evangelho (Hb 10:1-10). Mas agora, finalmente, Ele deu esse direito à igreja que prega o evangelho eterno da salvação (Ap 14:6-12) pela fé em Jesus.
O verdadeiro ministério é o de Jesus (Hb 7:1-12). Seus ministros de hoje são aqueles que O servem com exclusividade por meio de seu ministério e pregação. É por isso que o direito do altar e do antigo templo pertence aos ministros do evangelho (1Co 9:13, 14). Barnabé, que era um levita, deposita sua oferta aos pés dos apóstolos (At 4:36-37), para o cuidado da liderança da igreja. Assim, é estabelecida uma nova casa do Tesouro para os novos ministros da igreja de Jesus (Ef 4:10, 11; 1Co 4:1, 2).