Desenvolvendo Outros Líderes Através de Coaching
Líderes eficazes investem no crescimento pessoal de outros líderes. Como líderes da igreja, compartilhamos uma responsabilidade equivalente. Este artigo discute a necessidade de desenvolver líderes e educadores de mordomia e apresenta o coaching como uma das estratégias relevantes de desenvolvimento. Ele termina explorando como as orientações e procedimentos de coaching podem ser aplicados dentro dos ministérios de mordomia da Igreja Adventista do Sétimo Dia.
Desenvolvimento de parceiros e voluntários
Como pastor de igreja, líder departamental e administrador, você certamente reconhece que uma entidade eclesiástica depende da capacidade individual e coletiva da equipe de liderança para funcionar em seu potencial máximo. Servindo dentro da estrutura da igreja, a maioria de nós exerce apenas uma influência mínima na consecução de nossos objetivos estabelecidos. Em grande medida, nosso sucesso é mediado por outros, e isso é particularmente verdadeiro para uma igreja com uma estrutura multinível. O progresso de nossa missão, a saber, levar todos a colocar Deus em primeiro lugar, depende não apenas do nosso desempenho, mas do desempenho das camadas sucessivas de líderes da igreja e voluntários.
Para atenuar a percepção de falta de impacto ou de uma influência negativa de outros líderes nos resultados desejados, alguns de nós, como líderes da igreja, temos a tendência de ignorar nossos colegas e outros líderes da igreja e ir diretamente aos membros. No entanto, essa abordagem intensiva em recursos produz resultados limitados e no curto prazo. Investir no desenvolvimento de nossos parceiros e de outros líderes da igreja prova ser mais sustentável e eficaz não somente para o Departamento de Ministérios da Mordomia, como também para outros departamentos da igreja.
Além disso, quando nos envolvemos no desenvolvimento de nossos parceiros e de outros líderes da igreja, estamos emulando um componente principal do ministério terrestre de Jesus. Michael Youssef descreve a estratégia de Jesus: "A transformação dos discípulos em líderes ousados e imbuídos de autoridade é ainda mais surpreendente porque Jesus não escolheu uma dúzia de líderes natos. Em vez disso, escolheu uma dúzia de trabalhadores comuns, colocou-os em um intenso programa de mentoria e treinamento em liderança e os transformou radicalmente em uma força que impactaria o mundo".[1] Esta declaração destaca o investimento intencional de Jesus na capacitação de Seus seguidores imediatos e o impacto que isso teve na expansão de Sua missão.
Ellen G. White escreve sobre a necessidade de formar trabalhadores na igreja de Deus:
Ajude os inexperientes; não os desanime. Confie neles; dê-lhes conselhos paternais, ensinando-os como você ensinaria estudantes em uma escola. Não preste atenção apenas nos seus erros, mas reconheça seus talentos não desenvolvidos e treine-os para fazer bom uso dessas habilidades. Instrua-os com toda paciência, incentivando-os a seguir em frente e a realizar um trabalho importante. Em vez de mantê-los ocupados com coisas de menor importância, dê-lhes a oportunidade de obter uma experiência pela qual possam se converter em trabalhadores confiáveis. Muito será ganho para a causa de Deus dessa maneira.[2]
Uma das principais responsabilidade daqueles em posição de liderança consiste em formar um exército de líderes bem preparados. Além disso, como líderes da igreja, não devemos apenas colaborar com aqueles que já possuem habilidades bem desenvolvidas; nossa responsabilidade é identificar indivíduos com talentos e nos envolvermos com eles no refinamento para o serviço.
No Departamento de Ministérios de Mordomia, nossa estratégia para desenvolver colegas e educadores de mordomia tem consistido principalmente em dar treinamentos e criar recursos. É uma abordagem global (em vez de individualizada) e altamente centralizada no conhecimento. O resultado animador é que as pessoas podem rapidamente adquirir um conhecimento básico e, com confiança, pregar sermões, dar estudos bíblicos e organizar workshops sobre temas de mordomia. A abordagem educacional tem se mostrado útil na preparação de outros líderes.
No entanto, fornecer treinamento generalizado e compartilhar recursos pode não ser suficiente para um desempenho ideal. Aparentemente, competências adicionais – além do conhecimento básico do ministério – são essenciais para se obter sucesso como líderes ou educadores de mordomia. Entre certas habilidades cruciais, que muitas vezes faltam, estão a capacidade de definir claramente os objetivos; transformar conhecimento geral em planos específicos ao contexto; lidar com mudanças, falhas, questionamentos e incertezas; e avaliar conquistas. Essas deficiências observadas apontam para a necessidade de um desenvolvimento adicional de habilidades refinadas, além de um conhecimento básico de mordomia. O coaching pode ser considerado uma abordagem complementar para suprir essas necessidades.
Características do coaching
Melvin L. Smith define o coaching como: "uma relação facilitadora ou de ajuda que visa alcançar algum tipo de mudança, aprendizagem e/ou um novo nível de desempenho individual e organizacional".[3] Esta definição apresenta o propósito do coaching como uma "relação de ajuda," clarifica a natureza do procedimento como "facilitadora," e apresenta "desempenho" como o resultado esperado. O coaching é entendido como uma abordagem relacional, colaborativa e igualitária, em vez de autoritária ou de cima para baixo. Nesse contexto, o papel do coach é acompanhar o “discípulo” na descoberta de seus objetivos, explorar sua realidade, tomar consciência de suas opções disponíveis, estabelecer a estratégia adequada para alcançar os objetivos desejados e desenvolver ferramentas adequadas para avaliar seu desempenho.
O coaching é comumente utilizado nos esportes para ajudar a melhorar o desempenho. Há evidências de que a estratégia de coaching há muito tempo tem sido empregada em outras esferas da vida. Por exemplo, o povo Swahili, da África Oriental e Central, utiliza a expressão "habari gani menta" para designar o indivíduo que pergunta, "O que está acontecendo?" No contexto cristão, Jesus, embora raramente seja apresentado como um coach, exibiu qualidades de coaching durante Suas interações com Seus discípulos. Ele primeiro construía relacionamentos, intimidade e confiança com seus discípulos, sendo que o questionamento era fundamental para Sua estratégia de discipulado. Ele usava perguntas para criar consciência, desafiar e ensinar (Mt 8:26; 16:13; Mc 2:8; Mc 9:50; Lc 23:31; 24:17; Jo 5:44). Hoje, muitas organizações de alto desempenho estão usando o coaching para apoiar seus líderes e membros.
A metáfora do "coach" pode ser útil para entender melhor o que envolve o conceito de coaching. O coach é comparado a uma "carruagem" (português para coach), um veículo que facilita o movimento de uma pessoa de um ponto atual para um destino desejado. O viajante da carruagem (o “discípulo”) define o destino, o objetivo, e escolhe livremente embarcar no veículo. O exercício de coaching facilita a jornada. O coach atua como um parceiro de viagem, em vez de ser aquele que determina o destino e os meios para atingi-lo.
No entanto, é importante reconhecer algumas limitações do coaching. Quando há um déficit de conhecimento básico sobre a missão e a orientação organizacional, as pessoas precisam principalmente de treinamento, não de coaching. Em situações onde existem padrões e normas estabelecidos para desempenhos aceitáveis, os indivíduos precisam aprender os procedimentos corretos. Portanto, o coaching não deve ser uma abordagem exclusiva para auxiliar no desenvolvimento de nossos colegas e de outros líderes da igreja; em alguns casos, pode nem ser a intervenção adequada. Antes de escolher o procedimento de apoio correto, é necessária uma avaliação prévia das necessidades e expectativas. É essencial lembrar que o coaching não substitui outros procedimentos de apoio, mas é frequentemente complementar.
Benefícios do coaching
A adoção de uma orientação de coaching e seus procedimentos alinha-se bem com as crescentes aspirações de hoje de ser sensível às especificidades organizacionais locais e aos interesses e necessidades individuais. Isso complementa as estratégias tradicionais de desenvolvimento de recursos humanos, onde a pessoa que está sendo capacitada é tipicamente um receptor passivo de conhecimento ou planos predefinidos.
Curiosamente, Ellen G. White recomenda vigorosamente a abordagem consultiva para o desenvolvimento de trabalhadores na igreja de Deus:
Deus não deu toda a sabedoria a um único homem e a sabedoria não morrerá com ele. Os que assumiram cargos de responsabilidade devem modestamente considerar as opiniões de outros como dignas de respeito e considerá-las tão corretas como as suas. Devem lembrar-se de que Deus justificou e valorizou outros homens assim como a eles, e que Deus está disposto a ensinar e guiar esses homens.[4]
A mensageira do Senhor defende a abertura e o apoio a diversas ideias e planos na obra do Senhor. Sua declaração permanece válida, reconhecendo o valor de permitir que outros pensem, planejem e assumam responsabilidades. Ninguém detém o monopólio de gerar boas ideias para a igreja de Deus. Essa abordagem promove uma forma única de cooperação e unidade, valorizando a contribuição de todos, não apenas como implementadores, mas também como pensadores e planejadores. Ela equilibra a prática regular de disseminar iniciativas por toda a estrutura da igreja com a recomendação do apóstolo Paulo de “animar uns aos outros” (Hb 10:24). Assim, a orientação consultiva pode liberar novas ideias e energias por toda a igreja, conduzindo a iniciativas de mordomia mais relevantes e eficazes.
Usar o coaching como uma estratégia de desenvolvimento oferece alguns benefícios psicofisiológicos. Richard E. Boyatzis, Melvin L. Smith e Alim J. Beveridge explicam os efeitos físicos e emocionais positivos do coaching, muitas vezes descritos como o fator “sentir-se bem”.[5] Você se lembra de como se sentiu na última vez que pôde discutir seus objetivos e necessidades pessoais com alguém interessado em você e que se importa com suas ideias? O ambiente de coaching é geralmente propício ao aprendizado e melhora o desempenho.
Além disso, Sir John Whitmore, conhecido como o pai do coaching moderno, explica a eficácia do coaching referindo-se à hierarquia de necessidades de Maslow. Em um certo estágio da jornada da vida, as pessoas aspiram a se tornar indivíduos autorrealizados, que vem a ser o nível mais alto do desenvolvimento humano. Um indivíduo autorrealizado mostra inteligência emocional, responsabilidade, automotivação e autoconfiança, características que provavelmente produzem alto desempenho. Essas características são atingidas por meio do coaching, em vez de procedimentos de desenvolvimento que impõem planos e ideias sem a participação, adaptações e apropriação dos destinatários.[6] Portanto, a abordagem de coaching pode ser bastante atraente para indivíduos com vasta experiência, um histórico de sucesso e que aspiram grandes realizações.
Praticando o coaching
Um dos principais objetivos do coaching em termos de orientação ou procedimento de desenvolvimento consiste em ajudar outros líderes a "trazer à tona" "os propósitos do coração humano” (Pv 20:5). Como resultado, os beneficiários crescem em autoconsciência, ou mais precisamente, em consciência sobre o desígnio único de Deus para suas vidas e ministérios. Dorothy Siminovitch explica como isso pode ser alcançado: “Aumentar a consciência dos clientes requer um processo interativo e colaborativo, onde o coach oferece ao cliente observações baseadas em dados, perguntas e feedback que podem provocar novas percepções para o cliente”.[7] Relacionamentos, questionamentos e escuta ativa constituem os tijolos para a prática do coaching.
No que diz respeito ao questionamento, pode-se escolher seguir ou adaptar o simples modelo GROW de Sir John Whitmore. As letras da palavra inglesa GROW (crescer, em português) são usadas como um acrônimo para introduzir a sequência de perguntas:
Goals (Objetivos): Quais são os objetivos que você deseja alcançar?
Reality (Realidade): Qual é a situação atual? Quais são os desafios que você está enfrentando?
Options (Opções): Quais são as opções disponíveis para você? Que alternativas você pode considerar?
Will (Vontade): O que você vai fazer? Quais passos você se compromete a dar?[8]
Relacionamos abaixo três situações que ilustram a aplicação da orientação e do procedimento de coaching dentro do Departamento de Ministérios de Mordomia:
1. “Coaching” diretores recém-eleitos
Novos líderes de mordomia são nomeados periodicamente. Depois de compartilhar uma visão abrangente dos ministérios de mordomia e garantir que eles obtenham um conhecimento básico sobre mordomia, poderemos, por meio do coaching, acompanhá-los nestas quatro áreas: (1) identificar e formular seus objetivos, (2) autoavaliar sua realidade, se conscientizando dos facilitadores e dos obstáculos para atingir de seus objetivos, (3) explorar as várias opções disponíveis para alcançar seus objetivos, e (4) escolher o que colocarão em prática para atingir os objetivos desejados. Como resultado, esses líderes recém-nomeados estarão em melhor posição para criar um mapa personalizado do seu ministério, o que geralmente gera um grande entusiasmo para a implementação e facilita a avaliação do progresso.
2. Reorganizando nossas visitas
Visitar as diferentes entidades sob supervisão é uma responsabilidade importante para os líderes de mordomia e outros líderes da igreja que trabalham para a Associação Geral, divisões, uniões e associações. Durante essas visitas, as principais atividades geralmente envolvem treinamento e apresentação de mensagens inspiradoras. Para maximizar o custo muitas vezes alto dessas viagens, tendemos a estabelecer agendas repletas de reuniões públicas, deixando pouco espaço para interações individuais. Em contraste, Jesus, embora tivesse vindo para salvar o mundo inteiro, investiu muito tempo em conversas pessoais no deserto, em casas, nas montanhas e no Jardim. Embora ministremos treinamentos de qualidade, a maior necessidade daqueles que estamos visitando pode ser um espaço para compartilhar suas histórias de sucesso e fracasso, ou uma chance de testar suas ideias e planos, e partilhar momentos de oração com um parceiro de oração. A menos que reorganizemos nossas agendas e deixemos de lado algumas de nossas palestras tão bem preparadas para permitir que nossos anfitriões compartilhem, discutam e façam perguntas, podemos perder boas oportunidades de contribuir para o crescimento deles e o nosso.
3. Reuniões de Relatório, Revisão e Planejamento
As reuniões de Relatório, Revisão e Planejamento (ARP, na sigla em inglês), conforme esboçado na Orientação Estratégica de Mordomia da Associação Geral (2022-2025), representam mais uma oportunidade de usar o coaching para o crescimento de outros líderes. Essas reuniões, realizadas em intervalos regulares, seja presencialmente ou por meio de uma plataforma digital, envolvem líderes de mordomia e seus colegas que servem em um nível superior da organização da igreja. O objetivo é ceder um espaço onde nossos colegas possam discutir livremente a implementação de seus planos e a realização de seus objetivos – aqueles que adotaram para si mesmos e para seus departamentos. Durante as reuniões de ARP, líderes das organizações superiores atuam como coaches e facilitadores, em vez de avaliadores. Experiências recentes de reuniões de ARP envolvendo a liderança de mordomia da Associação Geral e diretores de mordomia das divisões mostraram que essa abordagem facilita um exame minucioso do desempenho e ajuda na elaboração de um caminho a seguir. As reuniões de ARP podem ser repetidas em toda a estrutura da igreja.
Conclusão
O sucesso da missão de Deus na Terra depende da nossa dedicação em formar outros líderes. Embora o treinamento, a pregação e o aconselhamento sejam estratégias já comprovadas, elas devem ser equilibradas com abordagens mais consultivas, íntimas e relacionais, como o coaching. Isso envolve ouvir e respeitar as aspirações dos outros, dar ânimo e apoiar os outros na realização do que eles acreditam ser os planos de Deus para sua vida e ministério.
[1]Michael Yousef, The Leadership Style of Jesus: How to Make a Lasting Impact (Eugene, OR: Harvest House Publishers, 2013), p. 183.
[2] Ellen G. White, Christian Leadership (Washington, D.C.: Ellen G. White Estate, 1985), p. 55.
[3] Melvin L. Smith, Ellen B. Van Oosten, e Richard E. Boyatzis, “Coaching for Sustained Desired Change,” em Research in Organizational Change and Development, eds. Richard W. Woodman, William A. Pasmore, e Abraham B. Shani (Bingley, England: Emerald Group, 2009), p. 150.
[4] Ellen G. White, Liderança Cristã (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2004), p. 49.
[5] Richard E. Boyatzis, Melvin L. Smith, Alim J. Beveridge, “Coaching with Compassion:
Inspiring Health, Well-Being, and Development in Organizations”, Journal of Applied Behavioral Science 49, no. 2 (2013): 153.
[6] John Whitmore, Coaching for Performance: The Principles and Practice of Coaching and Leadership, 5a. ed (Londres: Nicholas Brealey Publishing, 2017), p. 16, 17.
[7] Dorothy Siminovitch, “The Coach as Awareness Agent: A Process Approach”, em Professional Coaching: Principles and Practice, eds. Susan English, Janice M. Sabatine, e Philip Brownell (New York: Springer Publishing Company, 2018), p. 136
[8] Whitmore, Coaching for Performance, p. 96.