Minha jornada em direção à autossuficiência

O fato de eu ter crescido em um lar adventista me ajudou a ser financeiramente inteligente desde criança. Na igreja, eu esperava ansiosamente para ouvir o informativo missionário durante a Escola Sabatina – histórias sobre pessoas ajudando outras em terras longínquas por meio dos dízimos e ofertas trazidos à igreja. Eu ficava profundamente intrigada ao ver que meus centavos podiam literalmente ajudar famílias do outro lado do oceano e ansiava viajar e conhecer esses lugares. Eu sabia, porém, que ainda levaria anos para eu crescer e sair de casa, e então fazia o que podia sempre que tinha dinheiro de bolso. Lembro-me muito claramente de minha mãe nos ensinando a calcular o dízimo sobre a quantia de 10 pulas[1] (equivalentes a cinco reais). Ela também nos ensinou que, à medida que o dinheiro aumenta, ajustamos nossas doações de maneira proporcional ao aumento. Eu devia ter nove ou dez anos nessa época. Era muito empolgante receber nossos recibos do tesoureiro da igreja, como se fossem cartas de Deus! Eu sempre os guardava cuidadosamente e tinha por eles grande estima.

Ajudar os outros devolvendo dízimos e ofertas me proporcionava uma alegria tão grande, que isso realmente se tornou parte da minha identidade.

“Cada um contribua segundo tiver proposto no coração, não com tristeza ou por necessidade, porque Deus ama quem dá com alegria. Deus pode tornar abundante em vocês toda graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, ampla suficiência, vocês sejam abundantes em toda boa obra” (2Co 9:7, 8).

“Quem se compadece do pobre empresta ao Senhor, e este lhe retribuirá o benefício” (Pv 19:17).

Preciso Ganhar Dinheiro!

À medida que a vida avançava e eu ia crescendo, percebi que ajudar os pobres enquanto vivesse em um país do terceiro mundo exigiria muito dinheiro! Meus pais eram rigorosos e faziam tudo para que não esbanjássemos o dinheiro da família, sendo sempre econômicos. Também doávamos nossos brinquedos e roupas sempre que não precisávamos mais deles e fazíamos pequenos trabalhos nos fins de semana para apreciar e sentir a emoção de receber a recompensa do trabalho.

Vivíamos uma vida modesta em uma pequena e remota cidade de Botsuana. À medida que eu ia crescendo, meu desejo de viajar aumentava cada vez mais. Eu queria ir para Fiji e Java, Ruanda e Etiópia, e todos os lugares sobre os quais li nos informativos missionários! Foi então que percebi que, para realizar todos esses desejos, eu precisava ganhar dinheiro!

“Não acumulem tesouros sobre a terra, onde as traças e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam; mas ajuntem tesouros no céu, onde as traças e a ferrugem não corroem, e onde ladrões não escavam, nem roubam” (Mt 6:19-21).

Eu sempre orei para que Deus me ajudasse a realizar meus sonhos de ajudar os outros, ser financeiramente independente e viajar pelo mundo. Quando comecei a trabalhar, eu não conhecia toda a terminologia financeira sofisticada que temos hoje. A internet era algo novo. Não havia redes sociais, nem sequer o YouTube! Tudo o que eu sabia era que precisava de algo na minha vida que gerasse renda continuamente sem que eu precisasse trabalhar todos os dias. Eu também entendia que precisava economizar, investir e compartilhar meu dinheiro. Minhas fontes de informação eram livros, panfletos e jornais, como também a opinião do meu pai sobre isso e aquilo.

Primeiras decisões

Depois de terminar a faculdade, decidi morar em casa para economizar no aluguel – para a grande alegria dos meus pais! Em troca, eu ajudaria nas tarefas domésticas. À noite, pesquisava as melhores opções e oportunidades de investimento e poupança disponíveis, escrevia meus objetivos e planos semanais e guardava o máximo de dinheiro possível. Na igreja, eu dava ofertas especiais para a ADRA, AWR (Rádio Mundial Adventista, na sigla em inglês), Maranata, e assim por diante. Eu tinha a consciência de que era muito abençoada desde jovem por ainda ter meus pais em minha vida. Assim, em agradecimento a Deus, prometi ajudar os órfãos e necessitados por meio das minhas contribuições, estando determinada a juntar bastante dinheiro o mais rápido possível. Finalmente, estava no caminho da autossuficiência!

“Pois o Senhor, seu Deus, os abençoará, conforme prometeu. Assim, vocês emprestarão a muitas nações, mas não tomarão empréstimos; e dominarão muitas nações, porém elas não terão domínio sobre vocês” (Dt 15:6).

Após o meu primeiro ano de emprego, eu havia economizado o suficiente para dar uma entrada para a compra de uma propriedade. Procurei ao redor e logo encontrei alguém que estava vendendo um imóvel por um preço que eu podia pagar. Como eu morava com meus pais, aluguei a propriedade para obter uma renda adicional e, dessa maneira, concretizei minha jornada para criar uma renda passiva adicional recorrente. Eu ainda recebia meu salário do trabalho e, adicionalmente, estava ganhando o aluguel do imóvel, o qual pagava meu empréstimo.

Após dois ou três anos, fiz o mesmo negócio outra vez. Encontrei outro imóvel com preço acessível e consegui inquilinos para pagá-lo com a receita gerada pelo aluguel. Pude continuar com minha estratégia de economizar, investir e compartilhar. Alguns anos depois, deixei meu emprego original e iniciei um negócio como agente de viagens, organizando safáris para pessoas em visita à África.

Enfrentando a crise

Quando a crise causada pela COVID surgiu, meu negócio de viagens fechou devido aos lockdowns e fechamentos de fronteiras. O turismo estava parado. Ninguém podia fazer nada. Tudo parecia sombrio, mas adivinhe... Todos os meus inquilinos eram empregados de setores essenciais, e, assim, ainda podiam trabalhar e pagar seu aluguel como de costume. Portanto, eu tinha os meus investimentos me sustentando durante os lockdowns, e ainda conseguia alcançar meus objetivos financeiros, mesmo no meio da crise.

Senti-me como Elias, que foi alimentado por corvos durante uma grande fome. Deus me mostrou que Sua graça é mais do que suficiente para suprir todas as minhas necessidades. É muito importante perceber que a vida, assim como o clima, acontece em estações. Haverá primaveras, mas também haverá outonos e invernos, quando tudo morre ou não produz. Portanto, precisamos estar preparados para os invernos da vida fazendo economias e investimentos durante as estações da primavera e do verão.

A autossuficiência não é apenas uma questão de dinheiro. Durante a crise do COVID, também dedicamos tempo para cuidar do jardim e cultivar nossa própria horta. Logo tínhamos abóboras, repolhos, tomates e pimentões crescendo e fornecendo suprimentos. Precisamos pensar em todas as maneiras de desenvolver uma microeconomia própria em nossas casas, produzindo alimentos e riqueza de maneira independente. Se você consegue alimentar sua família com as coisas que cultiva, merece um aplauso. Essa é uma forma de autossuficiência.

“Restituirei os anos que foram consumidos pelos gafanhotos” (Jl 2:25).

“Eis que faço uma coisa nova. Agora mesmo ela está saindo à luz. Será que vocês não o percebem? Eis que porei um caminho no deserto e rios nos lugares áridos” (Is 43:19).

Aplicando o Ikigai

Durante os tranquilos meses do lockdown causado pela COVID-19, percebi que todos estavam gastando muito tempo em seus celulares e tablets em busca de entretenimento e inspiração. Na época, eu não estava nas redes sociais e passei a me perguntar como poderia usá-las a meu favor.

Os japoneses têm um conceito chamado ikigai. Através desse processo, você identifica: 1. O que você ama fazer; 2. Em que você é muito bom; 3. O que o mundo precisa; e 4. Como você pode ser pago para fazer isso. Percebi que amo viajar e fotografar. Sou boa em fazer as coisas parecerem boas. Notei que havia um espaço no mercado e, quando as fronteiras se reabriram, iniciei um novo negócio como estrategista de mídia social para empresas de hospitalidade. Logo os negócios estavam prosperando, uma vez que os hotéis e as agências de viagem precisavam de novas estratégias para reconquistar clientes e se posicionar globalmente. E lá estava eu para ajudá-los a conseguir isso!

Para usar o método Ikigai, é necessário se perguntar o que você tem à sua disposição. Você pode cozinhar e vender comida deliciosa? Pode costurar roupas bonitas? Pode consertar carros? Pode fazer tranças nos cabelos? Pode ensinar às pessoas uma habilidade? Pode elaborar lindos jardins e paisagens? Tem um quarto vago que pode alugar? Fala outro idioma que pode ensinar? Hoje em dia, o mundo está mais próximo do que você pensa. Hoje, mais do que nunca, o uso da internet e das comunicações móveis facilita encontrar clientes e fornecer-lhes serviços. Não precisamos ficar limitados aos antigos modelos de negócios de tijolos e concreto. A propósito, não há nada de errado com o antigo modelo de negócios, se ele atende ao mercado. No final das contas, um negócio deve resolver um problema e gerar lucro.

“Lembrem-se do Senhor, seu Deus, porque é Ele quem lhes dá força para conseguir riquezas; para confirmar a Sua aliança, que, sob juramento, prometeu aos pais de vocês, como hoje se vê” (Dt 8:18).

Se formos fiéis nas pequenas coisas, a nós será confiado o cuidado de grandes coisas. É imperativo ensinar crianças e jovens sobre a importância da fidelidade a Deus e também como gerar receitas por si mesmos desde jovens, para que não se afastem disso quando crescerem. Meus pais se esforçaram para que soubéssemos de onde vinham o dinheiro e os bens antes de nos darem essas coisas. Ainda me lembro dos dias em que eu devolvia 10 centavos como dízimo, acreditando que Deus os abençoaria e multiplicaria. Não subestime as coisas que o Senhor pode fazer por intermédio dos jovens.

“Exorte os ricos deste mundo a que não sejam orgulhosos, nem depositem a sua esperança na instabilidade da riqueza, mas em Deus, que tudo nos proporciona ricamente para o nosso prazer” (1Tm 6:17).


[1] Moeda de Botsuana

Dorcas Wellio

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