A pequenina escola cristã tinha lutado durante anos no pais do Oriente Médio predominantemente muçulmano para o qual meu amigo, um missionário da América do Sul, fora chamado. Poucos frequentavam a escola e os moradores locais achavam que a presença de uma escola cristã era uma maldição para eles. Eles expressavam seu desprazer atirando seu lixo no terreno da escola todas as noites sem falhar uma. Confiantemente, o missionário sulamericano surgia todas as manhãs e limpava o lixo. Embora as abordagens anteriores fracassassem, nosso amigo missionário confiava que o modelo incarnacional de Cristo de se humilhar na missão para vir entre Seus filhos e experimentar sofrimento e vergonha (Filipenses 2: 5-8), de alguma forma desencadearia um avanço. Ele sentia que se tivesse que ganhar a confiança das pessoas e exercer alguma influência sobre eles, ele tinha que se humilhar e limpar o lixo das pessoas. Ele já havia resolvido dar tudo como oferta de agradecimento ao Senhor. Obviamente foi difícil deixar para trás a segurança de seu lar e se aventurar no desconhecido, um lugar onde ele pouco conhecia das pessoas ou da sua cultura. No entanto, ele tinha que se humilhar ainda mais do que havia imaginado que teria. Durante anos, ele se levantava todos os dias às 4:00horas da manhã e limpava o lixo amontoado com quase dois metros de altura ao longo do muro da escola. Para realmente conhecer as pessoas, tem que se envolver com o “lixo” de suas vidas. Enquanto isso, ele começou a perder a visão do seu olho esquerdo. Mas, nada podia desviá-lo de sua tarefa. Ele estava convencido de que Deus avançaria na sua maneira humilde. Ele estava disposto a sacrificar o Ego e o Status para cumprir os propósitos de Deus. O resultado: O que era antes impensável aconteceu. Os moradores locais se comoveram pelo estrangeiro que estava silenciosamente – sem protestar – retirando o lixo. Finalmente os vilarinhos cessaram de descarregar lixo na escola e até confiaram seus filhos aos missionários. Com frequência, a maior barreira na missão não está com as pessoas a quem queremos alcançar, mas com nossa incapacidade de incorporar a compaixão e a generosidade de Deus (Mat. 12:7; Isa. 1:11-17). Este testemunho é um resquício da declaração de Hiebert (2008):
“Não é apenas a mensagem que pregamos, mas a vida que vivemos que atrairá pessoas para o evangelho” (Pág.319). Como Jesus se traduz em nosso contexto? Estamos dispostos a descer para alcançar os não alcançados? Eu creio que a compaixão que surge da contemplação da glória de Deus deveria ser o combustível de nossos esforços. Nossa missão e nossas ofertas podem perder a genuinidade a menos que sejam inspiradas pelo amor e pelo sacrifício exemplificado por Cristo (White, 1898, p. 37).
O desafio da Missão Fronteira
O Oriente Médio é parte do bloco descrito na figura 1 conhecido como a janela 10/40. Ela se parece com um cinturão circulando a terra – daí seu nome de “cinturão de resistência” posicionado dentro das latitudes 100 e 400 ao norte do Equador onde estão localizados a maioria dos países muçulmanos, Hindus e Budistas (Johnstone, 2009). A janela 10 /40 (Figura 1) incorpora outros países que têm um alta densidade de grupos de pessoas não alcançadas na vizinhança do bloco retangular original. Isso implica que dos 7.11 bilhões de habitantes do planeta, aproximadamente 5.11 bilhões vivem ali, 3.09 bilhões dentre os quais são considerados não alcançados (Joshua Project, 2020). Quase 43 por cento da população do mundo ainda tem que ouvir e responder ao evangelho. A janela 10/40 deve ser nosso foco missionário principal. Ela contém os mais pobres dos pobres e é a fortaleza mais assustadora de Satanás. Paradoxalmente, essa área recebe muito menos obreiros e recursos do que é necessário.
Tomando o quadro da Covid19 como referência, podemos inferir que o povo neste bloco resistente tem estado por muito tempo vivendo em isolamento. Eles estão separados do evangelho e isolados por causa de barreiras culturais, linguísticas, religiosas e políticas externas à igreja, mas inerente ao próprio povo. No entanto, a barreira mais assustadora não é externa, mas barreiras internas dentro da própria igreja. Essas pessoas foram isoladas do evangelho por causa da nossa reticência e da nossa negligência. O desafio peculiar é que essa vasta maioria de pessoas que vivem ali podem ser alcançadas somente através de abordagens de encarnação transcultural. Temos que lidar primeiro com nossas próprias barreiras internas para cruzar as barreiras externas e atingir essas pessoas resistentes ao evangelho. Isso exige pessoas ávidas de oferecer todo seu ser como missionários de frente e suas finanças para apoiar missionários e projetos nestas regiões.
Uma Teologia de Oferta Cristocêntrica
O evangelho é tudo sobre Jesus entrando em um mundo em confinamento – isolado de Deus por causa do pecado – reconciliando a humanidade com Deus e pondo um fim ao nosso confinamento (II Cor. 5:18-21). Como tal, ele voluntariamente ofereceu a mais pura e mais preciosa forma de oferta, Ele mesmo. Assim, Jesus incorporou a quintessência da generosidade através de sua morte sacrificial (Ef.5:2). Nós entendemos o verdadeiro significado de dar através dos atos de encarnação sacrificial de Jesus (João. 3:16). Na verdade, a palavra “oferta” é uma expressão de doação voluntária – durante a adoração – entretecida com o sacrifício de Jesus Cristo (Heb.10:10) no contexto do concerto de reconciliação (Arndt, Danker, & Bauer, 2000, p. 887). Portanto, uma melhor compreensão da conexão entre missão e oferta depende de uma avaliação da postura teológica, suposições e interesses através da lente encarnacional.
A mentalidade de sacrifício ou de oferta é o que leva a pessoa a dedicar sua vida a Cristo (White, 1979, p. 71). É improvável que a maioria de nós possa deixar nossa terra natal e se oferecer com missionário de frente. No entanto, nossas ofertas podem assumir vários aspectos. Por exemplo, nós todos podemos honrar a Deus e participar na missão através da devolução fiel dos dízimos e dando ofertas. Nós podemos dar para onde não podemos ir. O ato de doar é importante em si. Mas, segundo Jesus, é a mentalidade e a motivação por trás de nossa doação que é mais valorizada por Deus. Podemos doar da nossa abundância, mas o Senhor está buscando homens e mulheres que deem da plenitude de seus corações (Marc 12:41-44; Mat. 26:6-13). Deus está almejando que mais pessoas, como a viúva pobre e a mulher com o vaso de alabastro, estejam prontos a derramar seus corações nas suas ofertas ao Senhor. Através da sua encarnação e morte, Cristo se ofereceu a toda a humanidade. A missão de Deus em salvar a humanidade foi a maior oferta de todos os tempos – Seu filho na cruz.
O elo entre Missão e Oferta
A vida e a morte de Jesus é o primeiro elo entre missão e oferta. O nome “Emanuel”, Deus conosco, evoca o ato de Deus cruzando a barreira do pecado para unir criador e criaturas. O muro de separação foi derribado pelo sangue de Jesus (Ef. 2:13, 14; Rom. 5:10). A missão de Deus se iniciou e encontra seu cumprimento através da oferta do sangue de Cristo.
Seguindo o paradigma acima, a missão de Cristo mudou bruscamente para a inclusão do alcance transcultural, como resultado do apoio direto que Ele e Seus discípulos receberam de um grupo de mulheres (Lucas 8: 3). Enquanto ele pregava o evangelho através daquelas regiões, elas não hesitaram em trazer ofertas para a missão de Cristo. Imediatamente após, Jesus cruzou as barreiras em forma de lago e de tempestade para uma zona gentílica – a terra dos Gerasenos, onde o povo era culturalmente mais grego do que Judeu como fica evidente pela presença de porcos (Luc.8:26-39). O esforço de cruzar barreiras era intencional, como os eventos seguintes mostram Cristo alcançando uma mulher que era banida da sociedade por causa do seu problema de hemorragia, ressuscitando a filha de Jairo e dando poder e enviando 12 apóstolos (Luc.8:40-56). Parece haver uma correlação direta entre a dádiva das mulheres e a pregação aos gentios.
Depois da morte de Cristo, os discípulos se mostraram reticentes para se envolver com missão transcultural. A expansão da missão mundial foi possível quando os discípulos puseram tudo que tinham “em um cesto comum” (Atos 2:44-47). O compartilhamento dos recursos era evidência de que os Espírito Santo estava movendo a igreja para a missão (Atos 2:44; 4:32). Os discípulos também não hesitaram em vender seus bens (Atos 2:45; 4:34, 35), a fim de obter assistência financeira para igrejas em dificuldades. Essa parceria permitiu o redirecionamento de recursos para atender às prioridades da missão de Deus (II Cor. 8; Gal. 6: 6; Fil. 4:14). A igreja primitiva enfrentou as mesmas lutas que enfrentamos hoje. Eles tinham uma visão centrípeta da missão onde tudo revolvia ao redor de Jerusalém e do templo (Dumitrescu, 2008). E assim eles eram relutantes em se envolver com missão transcultural. Somente quando a perseguição se levantou e o templo foi destruído, eles deixaram Jerusalém. De fato, todo o livro de Atos trata dos atos do Espírito Santo lidando com barreiras dentro da igreja e forçando-a a abraçar sua missão. Os apóstolos deram tudo, incluindo suas vidas, para seguir o paradigma de Jesus Cristo.
Urgência em Ofertar para a Missão
A Missão de fronteira continua sendo o maior desafio no cumprimento da grande comissão. Ela exige a mentalidade de Cristo para realizá-la. É também notável que o último sinal antes do fim tem a ver com a proclamação do evangelho a todo grupo étnico no mundo (Mat. 24:14). Isso também lança luz no fato de que é também a tarefa missionária mais árdua. É assim, não por causa de barreiras externas da janela 10/40, mas por causa de nossas barreiras internas. Provavelmente é por isso que os trabalhadores e os recursos estão faltando (Luc. 10:2). Se devemos participar totalmente no cumprimento deste último sinal, uma disposição de se sacrificar pelos outros é necessária. A urgência de levar Cristo aos povos não alcançados da terra exige nossa presença física e também nosso total compromisso financeiro para a missão de fronteira.
As necessidades que enfrentamos hoje são as mesmas que eles enfrentaram na igreja primitiva. Tais necessidades podem ser atendidas apenas através das ofertas sacrificiais de todos os crentes inspirados no relacionamento com Jesus, levando-os a um novo entendimento de como usar as posses e os recursos. Precisamos também de novas prioridades. Enquanto estamos ocupados construindo catedrais em nossos próprios quintais, outros estão almejando uma cabana na qual adorar a Deus. A missão sofre mais com uma mentalidade interior. Se não podemos ir, podemos pelo menos dar fielmente para enviar missionários para a janela 10/40. Ao apoiar financeiramente a missão de Deus, doar para nossa igreja local é apenas o começo. Temos que considerar urgentemente o apoio ao evangelismo da linha de frente. Quando agimos isolados, nós alcançamos pouco. Quando agimos juntos, podemos fazer grandes coisas. Agora é o tempo de priorizar a missão de fronteira. Vale a pena oferecer tudo para esse propósito. Nossa missão pelos não alcançados receberá um tremendo impulso se nós virmos a oferta como um ato de adoração inspirado na visão da glória de Deus e da compaixão na cruz.
1 Arndt, W., Danker, F. W., Bauer, W., & Gingrich, F. W. (2000). προσφορά. No léxico Greco-Inglês do Novo Testamento e outras Literaturas Cristãs Primitivas (p. 887). Chicago, IL: University of Chicago.
2 Dumitrescu, C. (2008). Teologia de Missão no Velho Testamento: Um novo Paradigma. No Jornal de Estudos de missão Adventista: Vol. 4: No. 1, pp. 43-62.
3 Hiebert, P. G. (2008). Transformando Visões de Mundo: Uma Visão Antropológica de como as Pessoas Mudam. Grand Rapids, MI: Baker Academic.
4 Johnstone, P. (2009). Cobrindo o Globo. Em R. D. Winter & S. C. Hawthorne (Eds.), Perspectivas do Movimento Cristão Mundial: Um leitor (4th ed., pp. 377- 381). Pasadena, CA: William Carey.
5 Projeto Josué (2020). O que é a janela 10/40? Retirado em 20 de Maio, 2020 do site https://joshuaproject.net/assets/media/maps/10_40_window_religiousblocs. pdf 6 White, E. G. (1898). Uma apelo para Missões. Silver Spring, MD: Ellen
G. White Estate,